LERómetro CA#34
Escolher um livro apenas é, para mim, uma tarefa muito difícil. Do romance à antologia poética, do ensaio à literatura específica da História, há tantas e tão extraordinárias leituras que, escolher apenas um, se revela um desafio hercúleo. É por esta razão que a escolha do livro a partilhar tinha de recair em “Novas Cartas Portuguesas”, de Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa ou, como ficaram universalmente conhecidas, “As Três Marias”. Numa altura em que estamos tão perto de comemorar o 47.º aniversário da Revolução de Abril, esta escolha torna-se ainda mais pertinente e mais importante. Publicado em 1972, com edição da Chancela das Cores, então dirigida pela extraordinária poetisa Natália Correia, “Novas Cartas Portuguesas”, num exercício de reescrita das cartas de Mariana Alcoforado, a freira portuguesa de seiscentos, afirma-se como um libelo contra a ideologia vigente no período pré-25 de Abril, denunciando a guerra colonial, o sistema judicial, a emigração, a violência, a situação das mulheres e, claro, o resultado foi de uma invulgar originalidade e atualidade, do ponto de vista literário e social. A primeira edição foi recolhida e destruída pela censura de Marcelo Caetano, três dias após ter sido lançada no mercado e as autoras, as “As Três Marias”, perseguidas e sujeitas a um vexame público sem precedentes, a um processo judicial com repercussão internacional, a interrogatórios da PIDE/DGS... Só não foram presas porque, entretanto, aconteceu a Revolução de Abril. Entre poesia e cartas, narrativas breves e ensaios e reflexões profundas, este livro é um autêntico manifesto contra todas as formas de opressão, reivindicativo dos direitos humanos, de conteúdo subversivo, político, mas também literário, transformou-se num símbolo contra a ditadura. É por estas, e por muitas mais razões que recomendo este que é, entre tantos outros, um dos livros da minha vida. Boas leituras!
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